No Pain, No Gain!

 


Historicamente, o estudo da compreensão de leitura tem se caracterizado pela predominância de um processo enfatizando ora o texto ora o leitor, como fator essencial da compreensão. Quando se privilegia o texto, por exemplo, pressupõe-se que a melhoria na compreensão depende de qualidades intrínsecas do texto e que, na medida em que se modificam essas qualidades, está-se modificando os níveis de compreensão do leitor. Quando se privilegia o leitor, pressupõe-se que a compreensão do texto aumenta na medida em que se desenvolve no leitor as habilidades gerais da leitura.

Na verdade, há textos mais e menos compreensíveis do que outros como há também leitores mais e menos proficientes do que outros. Isso se deve a presença ou ausência de certos atributos, considerados como fatores de compreensão, tanto em textos como em leitores.

O enfoque no texto teve seu maior impacto nas décadas de 50 e 60. Época das fórmulas de inteligibilidade ("readability formulae"), as antologias básicas ("basal readers"), e os livros de textos simplificados, incluindo a ideia que mesmo conceitos complexos podiam ser expressos em linguagem simples, usando vocabulário comum, frases curtas e a voz ativa do verbo. Sistema muito usado em livros paradidáticos publicados nos Estados Unidos para a leitura dos alunos de primeiro e segundo graus, onde esses critérios de escolha do léxico e estrutura eram seguidos à risca pelas editoras.

No entanto, um texto será mais ou menos compreensível, não porque apresenta um vocabulário mais ou menos difícil, mas porque apresenta uma realidade que está mais ou menos próxima da nossa compreensão. Na área da psicologia, o trabalho pioneiro de Bartlett sobre a lembrança mostrou que as pessoas não são capazes de recordar o que vêem, mas o que percebem e o que percebem está condicionado a aspectos culturais e ideológicos, que determina uma visão pessoal da realidade. Não se entende um texto cujo assunto se desconhece, ainda que escrito com palavras simples e de alta frequência no quotidiano.

O livro didático que pretende preparar para a vida pode estar fazendo o contrário quando insiste na simplicidade da linguagem, deixando o aluno despreparado e matando seu interesse.

Não se chega ao todo apenas com movimentos uniformes pela página impressa, mas também através de saltos. O uso de recursos tipográficos (negrito, itálico, etc.), intertítulos, quadros, ilustrações, destaques dos principais pontos do texto, usados nos periódicos modernos, facilita essa abordagem não-linear do texto. Em termos de apresentação gráfica, estudos têm demonstrado, por exemplo, que o uso de intertítulos facilita a compreensão, principalmente quando os sujeitos não possuem conhecimento prévio do assunto. As ilustrações, principalmente com textos complexos, aumentam não só a compreensão mas também a retenção. De um modo geral, percebe-se que o uso de recursos gráficos é mais importante quando o conteúdo do texto é de apreensão mais difícil pelo leitor, o que sugere a existência de um mecanismo de compensação entre formas de apresentação e conteúdo.

Existem também recursos internos de estruturação dos textos que podem facilitar ou dificultar sua compreensão. O texto pode ser sensível ou insensível ao leitor. O texto sensível apresenta características que parecem facilitar a compreensão, tais como a proximidade na anáfora, o uso de conectivos entre as orações, a preferência por definições explícitas ou a apresentação de informações completas.

Em termos de estruturação de textos, nota-se que, sob iguais condições, alguns tipos de textos proporcionam melhor compreensão do conteúdo do que outros. O texto narrativo produz escores mais altos em testes de compreensão do que o texto expositivo, por exemplo.

O interesse e a atitude são também fatores importantes na compreensão do texto. Uma atitude positiva em relação à leitura produz escores mais altos. O interesse, quando genuíno, é também um fator importante; Glazer destacou a importância do envolvimento emocional como fator de sucesso na leitura e Henk et al mostraram que o envolvimento do aluno pode ser um fator mais importante na interpretação de um texto do que o conhecimento prévio do assunto.

Portanto, os fatores relacionados a compreensão do texto, não estão apenas no domínio cognitivo (conhecimento prévio do tópico, familiaridade com os aspectos culturais, conhecimento da língua, capacidade de raciocínio) mas também em fatores do domínio afetivo (interesse, atitude, empenho).

Texto Baseado em: FATORES DA COMPREENSÃO NA LEITURA
Vilson J. Leffa - Universidade Católica de Pelotas