Mostrando postagens com marcador LEITURALISMO. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador LEITURALISMO. Mostrar todas as postagens

Venda de Livros não é Formação de Leitores

 


Um conceito institucionalizado, divulgado e noticiado, é que o brasileiro lê pouco. Quando, na verdade, temos tiragens de livros na casa dos milhares, quando não milhões, tornando o mercado editorial brasileiro um dos maiores no cenário mundial.

No entanto, verdade verdadeira, é que o maior cliente desse mercado sempre foi o próprio Governo. Portanto, acredito que esse preconceito aberto e declarado, esteja relacionado as pessoas que não compram livros, nem leem aquilo que certa elite gostaria.

A média de leitura do brasileiro, é de 1,5 livro por ano. Mas, se considerarmos o dado, que somos uma das nações que mais frequenta redes sociais no mundo, onde se usa o texto como a principal forma de comunicação, poderíamos elevar consideravelmente a média de leitura nacional! Por outro lado, essa reflexão, constata um fato! Lemos mal, ouvimos mal e enxergamos mal. Ou seja, nossa leitura de diversas linguagens, interfaces e gêneros é péssima.

Péssima, porque leitura não deve ser uma decodificação mecânica de informações com respostas convergentes a estímulos escritos pré-elaborados, que transformam o leitor num consumidor passivo de mensagens não-significativas e irrelevantes.

Acredito, que esse status quo da nossa leitura, é reflexo dessa institucionalização, de uma imagem do que é ser leitor, de como essa prática deve ser exercida e de quais são as condições necessárias e idealizadas para sua realização. Por esse motivo, testemunhamos a leitura ser erroneamente incentivada e promovida em certas políticas públicas, que fazem referência exclusiva à leitura de livros na sua forma impressa, de gêneros e títulos em sua maioria validados pelo mercado editorial.

A ostentação e divulgação de Bienais, refletem a distância que há entre a condição leitora que se diz e que se faz quando o assunto é incentivo à leitura. Mecanicamente associando leitura à livros ou à literatura e consequentemente, incentivo à leitura, à leitura de livros, mantendo a ignorância sobre as práticas de incentivo à leitura que efetivamente devem ser realizadas. Pois, o objetivo primordial, principal, fundamental e crucial das feiras e bienais, é o incentivo à venda de livros! Leitor é quem compra livro. Não leitor também compra, provavelmente para dar de presente a um leitor! Portanto, uma feira de livro não pode ser considerada como política pública de incentivo à leitura, assim como construção de bibliotecas não garante a formação de leitores!

Em minhas labutas questiono sobre obras conhecidas sem serem lidas, como Romeu e Julieta. Ouvi leituras realizadas por alunos semianalfabetos do EJA, muito superiores a leituras de alunos universitários. Porque conhecimento prévio, discernimento e raciocínio, são qualidades inerentes... Conhecimento histórico, social e neurológico do processo; peculiaridades relacionadas a estratégias, níveis, fases e tipos de leitura; além das características do objeto, interfaces e técnicas de escrita, são cruciais no incentivo à leitura e proficiência leitora, e devem ser adquiridos, antes de um livro!



 


Precisamos da Leitura Proficiente

 


Se em nossa época a leitura proficiente diminui vertiginosamente, ao mesmo tempo, cresce o elogio da ignorância, essa forma cognitiva impotente e, contudo, muito prepotente, alguém transforma o não saber em suposto saber, a resposta pronta é transformada em verdade.

Cancelada a curiosidade, como sinal de um desejo de conhecimento, a leitura proficiente se torna inútil. Assim, a ignorância que nos permite saber se opõe à que nos deforma por estagnação. A primeira gosta de leitura, a segunda detesta.

No limite, a ignorância mal cuidada torna-se discurso e prática de vida. O poder na sua forma violenta, se alimenta da ignorância e o ignorante se regozija quando não encontra nada que o negue. E porque não cuidamos da ignorância, ela domina a sociedade. Ela é transmitida, ela é “propagandeada”. A consciência da ignorância é a antipropaganda, porque ela pede mais que publicidade, ela pede conhecimento.

Há um nexo entre a ignorância como questão cognitiva e a ignorância como questão política? A ignorância filosófica nos faz perguntar. A ignorância usada como bomba atômica contra populações inteiras na política de extermínio do conhecimento e da ação política que dela derivaria, não nos deixa responder. A falta de leitura costura os olhos com fio de aço impedindo o despertar para os fatos.

A falta de pensamento reflexivo nos assusta e é a responsável pelo clima de embrutecimento que vivemos hoje. É bom saber que todo embrutecimento é produzido pelos sistemas que usam a burrice a seu favor.

A intolerância que vem sendo potencializada em todas as escalas, não é fruto do acaso. Mas, intencionalmente provocada... esse entendimento e discernimento, só será possível se mudarmos os rumos de nossa subjetivação.

Ou seja, precisamos da leitura proficiente. Não porque o pensamento dependa da gramática ou da língua formal, mas porque leitura proficiente é um tipo de experiência que nos ensina a desenvolver raciocínios, nos ensina a entender, a ouvir e a falar para compreender. Nos ensina a interpretar. Nos ajuda a elaborar questões, e fazer perguntas. Perguntas que nos ajudam a dialogar, ou seja, a entrar em contato com o outro. Nem que este outro seja, em um primeiro momento, apenas cada um de nós mesmos.

Precisamos da leitura proficiente, porque muitos de nós foram educados para não pensar, e consequentemente a não gostar do que não conhecemos.

Hoje falamos da facilidade de acesso a meios de comunicação e transmissão da informação como a internet, mas o meio de acesso mais fundamental ao conhecimento sempre foi a leitura. Pois, ela implica um modo específico de percepção que também nos constrói no sentido da forma como nos afeta.

Não se trata, apenas dos conteúdos aos quais temos acesso, mas do tipo de pessoa que nos tornamos em função da experiência com a leitura. O que fazemos nos constrói intimamente, nossa experiência é o efeito do que fazemos e, certamente, do que é feito de nós.

Texto baseado em Marcia Tiburi - 31 de janeiro de 2016

 




Incentivando Leitura com Sinceridade

 


Como incentivar o hábito de leitura proficiente para alunos desprovidos de conhecimentos que envolvem a arte de ler?! Como justificar a importância da leitura num país onde bumbum, jogador de futebol, ator de novela e youtubers, se tornaram culturalmente sinônimos de inteligência e exemplo de superação?! Como justificá-la diante de uma tecnologia que eleva o índice de leitores funcionais, passivos, irreflexivos e inabilitados para interpretar e digerir a avalanche diária de conteúdo pré-mastigado?!

Visto, que adquirimos determinado conhecimento, quando conseguimos justificá-lo, seja para nós mesmos ou para outrem, creio que tais indagações necessitem de respostas personificadas e relacionadas à vida cotidiana desses alunos. Pois aprendi, que o conhecimento só pode ser justificado, quando emerge de determinadas realidades como um despertar.

Ou seja, creio numa atividade de incentivo à leitura, pontuando e promovendo um diálogo sincero, abastecido de conhecimentos que dissolvam paradigmas negativos do hábito. Uma atividade sem sinais de livropsicopatia ou lirismo insanamente exacerbado e redundante sobre literatura. Do contrário, é preciso aceitar o tédio, o repúdio e o esforço desinteressado desses alunos.

Creio na sinceridade do argumento como estratégia! Estratégia para surpreender, engajar e despertar uma percepção de que a apreensão e a significação do prazer, não está na leitura, mas naquilo que aprendemos através dela!

Se alunos ouvissem que a “Leitura” é uma atividade cansativa, tediosa e essencialmente desagradável como cruzar um oceano de páginas num pequeno barco a remo, onde cada remada é um esforço acompanhado pela dor no pescoço, nas costas e nos olhos, e que na sua essência, leitura não é sinônimo de livro ou literatura?! Creio que teríamos alunos com os olhos honestamente arregalados e ouvidos abertos para ouvir, que na verdade, leitura se trata de um esforço que os tornará capazes de lidar com uma realidade de alternativas infinitas e opções limitadas, com questões sem resposta, com recursos escassos e tempo curto. Alunos abertos para ouvir sobre a desconstrução de conceitos que elitizam o hábito, abertos a ouvir sobre o poder da leitura na história da humanidade, abertos a ouvir que possível se apoderar das estratégias que viabilizam o despertar para essa ação tão fundamental na formação de si – mesmos.

Sinceramente, não prometo que ao final da atividade todos serão amantes dos livros, mas garanto que farão leituras de seus relacionamentos sociais e afetivos em busca de compreensão e interpretação de atitudes mais competentes; que farão leituras de notícias, novelas, filmes, seriados e músicas com outros olhos e ouvidos.



O Desencanto da Imagem

 


O avanço tecnológico foi dotando a humanidade de artefatos que ampliaram significativamente a possibilidade receptiva, mas ao mesmo tempo, notamos o aparecimento de mediações cada vez mais complexas entre os homens, e entre estes e a realidade. Mas a recepção continua sendo um ato solitário. Hoje, as imagens se propagam com tal velocidade que, em questão de minutos entre o fazer e disponibilizar, curtir e compartilhar, tornam-se irrelevantes, ou seja, invisíveis, descartáveis.

No geral, todos ficam fascinados com sua própria imagem. Um espírito narcisista domina a sociedade contemporânea que publica sem piedade seu próprio cotidiano. Esse uso exacerbado da primeira pessoa pelo sujeito não tem nada de insubordinação ou produção de conteúdo transformador; tem sim a forma de um discurso antipolítico, desprovido de qualquer natureza crítica.

Os mais indignados podem resistir a esta etapa de produção e circulação de imagens; os encantados com as tecnologias devem surfar intensamente o novo momento; mas os observadores atentos podem traduzir essa etapa como o vazio silencioso de uma civilização mobilizada pela imagem técnica que, por sua vez, hegemônica e padronizada, desencanta e não provoca emoção alguma neste novo começo. Esse é o desenho social imposto pela facilitação tecnológica trazida pela globalização: um enorme espelho que propaga uma profusão de imagens inúteis, que se propõem duradouras, mas são apenas efêmeras fotografias, chamadas de selfies.

Autor: Rubens Fernandes Junior
Jornalista, curador e crítico de fotografia, doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, professor e diretor da Faculdade de Comunicação da Fundação Armando Alvares Penteado (Facom-FAAP)



Ver é Inquietar-se

 

Num momento em que a visibilidade e a transparência da comunicação determinam o quanto somos reconhecidos nos diferentes grupos em que atuamos, não deixa de ser interessante pensar no velho cartão postal como uma mídia aberta, com imagem e texto, que circulou livremente durante décadas mundo afora. Hoje, foi substituído pelos aplicativos tipo Instagram, WhatsApp, entre outros, locais de livre e imediata circulação de imagens e textos. Sou colecionador de cartões postais e, de tempos em tempos, eu me surpreendo com mensagens inscritas no verso dos cartões, que operam como codificações específicas entre os interlocutores. Sim, há entre os polos comunicacionais que trocam cartões algumas evidências e alguns segredos. Apesar da mensagem circular aberta numa rede de distribuição, nem todos podem decodifica-las integralmente. E isso é mágico, pois basta um rápido olhar nas redes sociais para encontrarmos os mesmos enigmas, de simplicidade impressionante, que dão continuidade a uma comunicação especial que domina a esfera da privacidade.

Recentemente, ao adquirir um lote de cartões postais de Rio Claro (minha cidade) e de Ouro Preto, encontrei em um deles a seguinte inscrição: “Se a realidade não é brilhante como nos sonhos, tem, pelo menos, a vantagem de existir”. Segundo quem remeteu (e selecionou) esta imagem, a autoria do texto é de Machado de Assis. O cartão postal que mostra uma mulher fotografando uma criança, é do chafariz de Marília e Dirceu, dois amantes, e remete ao poema publicado no final do século XVIII que marcou o drama da literatura brasileira do período.


Aliás, muito interessante para pensar a polêmica essência da imagem técnica, representação que perpassa o nosso cotidiano. Ao associarmos a mensagem à imagem e ao texto, criamos uma nova imagem, que contém em si uma série de outros atributos. Temos então a oportunidade de entender a potência de um simples artefato criado em sincronia com os avanços da indústria gráfica, cuja finalidade era acelerar a comunicação. O fragmento machadiano é um raro achado num mar de textos banais trocados nesse tipo de correspondência. Como afirmei acima, me encanta os textos que insinuam alguma imprevisibilidade. Afinal de contas, como “ler” a complexidade da mensagem (imagem mais texto) que deveria ser simples pela natureza do suporte, mas que se torna um enigma quando olhado com os olhos de hoje?

Outro texto, tão instigante quanto o anterior está anotado neste cartão postal da Estação da Estrada de Ferro Central, de Recife, circulado em 1905. Nele se lê: “Vou trabalhar para ver se decifro seu enigma, embora não tenha prática alguma. Amigáveis saudações.” Mais uma vez, como entender essa comunicação dotada de vazios, de lapsos que dependem de outros postais, talvez já perdidos. Pensando de outro modo, a estação de trem é o local de chegadas e partidas, de deslocamentos tão velozes quanto o movimento do cartão postal. Operar nessa instância da comunicação é tentar buscar a enorme capacidade que este tipo de correspondência tem de revelar o incomum, que provavelmente passou despercebido pelos inúmeros olhos desatentos que foram sensibilizados com a imagem e o texto.


Olhar com certa delicadeza para o passado é tentar entender seus nexos. Ao contemplá-los, defende André Rouillé, “o imaginário dá lugar à percepção; o passado e a memória, à presença; o mítico longínquo, à realidade próxima: simplesmente visível, sem pano de fundo”.

É inestimável o valor psicossocial da troca de comunicação veiculada através dos velhos cartões postais, que impressionam pela capacidade de informar o essencial. Produzido para ser efêmero e descartável, ganhou sobrevida quando se tornou objeto colecionável. Assim como hoje idealizamos um futuro sem memória do passado, devido à velocidade de transmissão da informação e sua imediata descartabilidade, podemos ser mais otimistas se pensarmos que os cartões postais, também filhos da aceleração do seu tempo, permaneceram esquecidos em caixas e álbuns. Rejeitados por seus herdeiros e responsáveis, ganham relevância ao emergirem como peças “quase únicas” do incompleto quebra-cabeça de inestimável importância cultural.

Como afirma Didi-Huberman, “o objeto, o sujeito e o ato de ver jamais se detêm no que é visível (…) Ver é sempre uma operação de sujeito, portanto uma operação fendida, inquieta, agitada, aberta”.

Autor: Rubens Fernandes Junior
Jornalista, curador e crítico de fotografia, doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, professor e diretor da Faculdade de Comunicação da Fundação Armando Alvares Penteado (Facom-FAAP).




Imagens ardem, museus queimam

 


“Não se pode falar do contato entre a imagem e o real sem falar de uma espécie de incêndio”, disse Didi-Huberman. Trata-se de um desses momentos em que a teoria, para dar conta da imagem, precisa recorrer à poesia. Quando ele dizia que “as imagens ardem”, mesmo que tenha nos alertado sobre o risco, não poderíamos imaginar que sua metáfora se confrontaria com uma literalidade tão estúpida.

O real a que ele se refere é, de certo modo, o oposto disso que chamamos vulgarmente de realidade (essa “nossa realidade” que, entre outras coisas, permite que um museu chegue ao ponto de incendiar-se), um estado de exceção que tende a se conservar, uma condição à qual nos habituamos, que tomamos como dada porque já não acreditamos poder transformá-la. Enquanto nossa realidade é evidentemente opressora, o real a que Didi-Huberman se refere é algo de uma ordem sempre inconformista, é a parte rebelde da cultura, não se aceita como mera domesticação da natureza. É uma dimensão da história em que as tensões do passado permanecem vivas e perturbam a linha do tempo em que os fatos se sucedem. O real é o lugar que revela sem cessar as fissuras do processo civilizatório e que faz retornar tudo aquilo que ele recalca.


Por sua vez, a imagem é a própria inflamação que surge na carne desse real que não se deixa codificar. Ela é mais do que um discurso sobre o mundo, ela é o seu sintoma. Chamuscada pelos acontecimentos, algo da imagem surge à nossa revelia, assim como as cicatrizes. Dizemos muitas coisas por meio dela, mas ela segue dizendo por si mesma o que para nós se torna interdito. Mesmo que operada por uma técnica, algo na imagem permanece como transbordamento de pulsões que as gramáticas não conseguem organizar. Por sua vez, ela é capaz de nos tocar com o mesmo fervor. Nem tudo nela pode ser decifrado pelas metodologias de que o olhar se mune. As imagens falam a um olhar que é corpo, que é desejo, que é selvagem. Daí, elas ardem em nós.

As condições implicadas nessa relação intensa com a imagem não poderiam ser mais avessas àquelas que permitem o incêndio de um museu. É porque as imagens queimam, ou melhor, é para que sejam impedidas de queimar que as imagens são deixadas sob o risco da literalidade do fogo. Já não se trata do fogo da paixão (do pathos). É só o fogo frígido do fio descascado, das faíscas dos motores, dos produtos inflamáveis, da bituca de cigarro, aquele ignorado pelos orçamentos e bem mapeado pelas apólices de seguro.


Para além do jogo de palavras, o texto de Didi-Huberman nos ajuda a pensar o que aconteceu. É bem evidente que as sensibilidades cultivadas pela imagem emperram as decisões pragmáticas que “nossa realidade” exige. A arte sempre instaura perguntas no momento em que a autoridade quer impor respostas imediatas. As imagens são críticas, elas exigem e expõe os critérios, instauram crises. A razão pragmática não suporta esse estado patológico de dúvida. É preciso agir, buscar uma solução. A incineração literal é justamente aquilo que os fascismos oferecem de forma recorrente como resposta definitiva para as diferenças que não toleram (os nazistas se referiam às práticas nos campos de extermínio justamente como “solução final”).

Não se trata aqui de fantasiar um incêndio arquitetado. Mas sim, ele tem uma arquitetura (da qual o MBL berrando na porta dos museus é apenas sua fachada mais tosca e fácil de enfrentar). Também não é que nos querem ignorantes. Mais sutil que isso, nos querem ponderados, razoáveis, eficientes, até mesmo instruídos, dotados de aptidões que respondam não necessariamente às urgências (às feridas), mas às prioridades pactuadas (emprego, polícia, asfalto, até mesmo mais escolas, com mais aulas de ciência e matemática e menos de filosofia e arte).


Rancière observou que a arte tem sempre uma vocação política porque é capaz de intervir no modo como se partilha o que é “comum”, a linguagem, a percepção, o tempo, o sensível, essas coisas todas que estão aí para todos, mas que tendem a ser distribuídas de forma desigual. Se o incêndio revela um projeto, não é tanto o de impedir a instrução, mas o de modular e conter as sensibilidades, inclusive entre as elites bem formadas, que passeiam pelos museus do mundo, mas que passam longe dele quando voltam às prioridades de suas vidas produtivas. Essa “partilha do insensível”, se assim podemos dizer, não cria propriamente consenso, mas consentimento. Na verdade, apatia! Quando as imagens deixam de arder, quando ficamos anestesiados, quando a arte e a cultura se confundem com a hora do recreio que se opõe à prioridade do trabalho, museus pegam fogo.

Didi-Huberman não ignorou essa possibilidade: “frequentemente, as lacunas são resultado de censuras deliberadas ou inconscientes, de destruições, de agressões, de autos de fé. O arquivo é cinza, não só pelo tempo que passa, como pelas cinzas de tudo aquilo que o rodeava e que ardeu. É ao descobrir a memória do fogo em cada folha que não ardeu, onde temos a experiência — tão bem descrita por Walter Benjamin, cujo texto mais querido, o que estava escrevendo quando se suicidou, sem dúvida foi queimado por alguns fascistas — de uma barbárie documentada em cada documento da cultura”. O fogo literal almeja apagar o fogo poético. Mas acaba por revelá-lo.


O Museu Nacional resistiu o quanto pôde não tanto pela erudição nele investida, mas graças aos corpos que, apesar de tudo, ainda ardiam pela imagem. É apenas por uma condição sintomática que insistimos em devotar nossas vidas ao estudo das imagens e à prática da arte. Ou, como vimos nesse episódio, foi pela paixão – não pela renovação da bolsa Capes ou por mais um tópico no Currículo Lattes – que pesquisadores arrombaram portas para resgatar alguns artefatos. Ali, era o fogo resistindo ao fogo.

Resta como esperança a vocação que a imagem tem para a sobrevivência. Ela se expressa também nas cinzas, e ainda mais intensamente. Se, como sugeriu Benjamin, todo monumento da cultura é também um monumento da barbárie, as ruínas deixadas pela barbárie expõem os sintomas da cultura. Já não se pode esconder com artifícios burocráticos o tamanho da dor aí implicada, como se cultura, arte e memória fossem penduricalhos que não fazem falta quando quebram. O Museu Nacional é agora uma ferida aberta e dolorida que não se pode mais esconder.

Autor: Ronaldo Entler
Jornalista, pesquisador, doutor em Artes pela Universidade de São Paulo (ECA-USP), professor e coordenador de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação da Fundação Armando Alvares Penteado (Facom-FAAP).


No Pain, No Gain!

 


Historicamente, o estudo da compreensão de leitura tem se caracterizado pela predominância de um processo enfatizando ora o texto ora o leitor, como fator essencial da compreensão. Quando se privilegia o texto, por exemplo, pressupõe-se que a melhoria na compreensão depende de qualidades intrínsecas do texto e que, na medida em que se modificam essas qualidades, está-se modificando os níveis de compreensão do leitor. Quando se privilegia o leitor, pressupõe-se que a compreensão do texto aumenta na medida em que se desenvolve no leitor as habilidades gerais da leitura.

Na verdade, há textos mais e menos compreensíveis do que outros como há também leitores mais e menos proficientes do que outros. Isso se deve a presença ou ausência de certos atributos, considerados como fatores de compreensão, tanto em textos como em leitores.

O enfoque no texto teve seu maior impacto nas décadas de 50 e 60. Época das fórmulas de inteligibilidade ("readability formulae"), as antologias básicas ("basal readers"), e os livros de textos simplificados, incluindo a ideia que mesmo conceitos complexos podiam ser expressos em linguagem simples, usando vocabulário comum, frases curtas e a voz ativa do verbo. Sistema muito usado em livros paradidáticos publicados nos Estados Unidos para a leitura dos alunos de primeiro e segundo graus, onde esses critérios de escolha do léxico e estrutura eram seguidos à risca pelas editoras.

No entanto, um texto será mais ou menos compreensível, não porque apresenta um vocabulário mais ou menos difícil, mas porque apresenta uma realidade que está mais ou menos próxima da nossa compreensão. Na área da psicologia, o trabalho pioneiro de Bartlett sobre a lembrança mostrou que as pessoas não são capazes de recordar o que vêem, mas o que percebem e o que percebem está condicionado a aspectos culturais e ideológicos, que determina uma visão pessoal da realidade. Não se entende um texto cujo assunto se desconhece, ainda que escrito com palavras simples e de alta frequência no quotidiano.

O livro didático que pretende preparar para a vida pode estar fazendo o contrário quando insiste na simplicidade da linguagem, deixando o aluno despreparado e matando seu interesse.

Não se chega ao todo apenas com movimentos uniformes pela página impressa, mas também através de saltos. O uso de recursos tipográficos (negrito, itálico, etc.), intertítulos, quadros, ilustrações, destaques dos principais pontos do texto, usados nos periódicos modernos, facilita essa abordagem não-linear do texto. Em termos de apresentação gráfica, estudos têm demonstrado, por exemplo, que o uso de intertítulos facilita a compreensão, principalmente quando os sujeitos não possuem conhecimento prévio do assunto. As ilustrações, principalmente com textos complexos, aumentam não só a compreensão mas também a retenção. De um modo geral, percebe-se que o uso de recursos gráficos é mais importante quando o conteúdo do texto é de apreensão mais difícil pelo leitor, o que sugere a existência de um mecanismo de compensação entre formas de apresentação e conteúdo.

Existem também recursos internos de estruturação dos textos que podem facilitar ou dificultar sua compreensão. O texto pode ser sensível ou insensível ao leitor. O texto sensível apresenta características que parecem facilitar a compreensão, tais como a proximidade na anáfora, o uso de conectivos entre as orações, a preferência por definições explícitas ou a apresentação de informações completas.

Em termos de estruturação de textos, nota-se que, sob iguais condições, alguns tipos de textos proporcionam melhor compreensão do conteúdo do que outros. O texto narrativo produz escores mais altos em testes de compreensão do que o texto expositivo, por exemplo.

O interesse e a atitude são também fatores importantes na compreensão do texto. Uma atitude positiva em relação à leitura produz escores mais altos. O interesse, quando genuíno, é também um fator importante; Glazer destacou a importância do envolvimento emocional como fator de sucesso na leitura e Henk et al mostraram que o envolvimento do aluno pode ser um fator mais importante na interpretação de um texto do que o conhecimento prévio do assunto.

Portanto, os fatores relacionados a compreensão do texto, não estão apenas no domínio cognitivo (conhecimento prévio do tópico, familiaridade com os aspectos culturais, conhecimento da língua, capacidade de raciocínio) mas também em fatores do domínio afetivo (interesse, atitude, empenho).

Texto Baseado em: FATORES DA COMPREENSÃO NA LEITURA
Vilson J. Leffa - Universidade Católica de Pelotas



Interpretar Não É Compreender

 


Compreender e interpretar são dois conceitos que se aproximam em alguns aspectos e se distanciam em outros. Enquanto alguns autores destacam a semelhança entre os dois, a ponto de muitas vezes confundir um com o outro, sem perceber a diferença. No entanto, a distinção é necessária para uma leitura produtiva.

A compreensão, não é uma ação consciente executada pelo leitor sobre um determinado objeto de leitura; é uma experiência que se vive abaixo da superfície da consciência, pela sua complexidade e pela rapidez com que acontece. A compreensão não só se desdobra em vários níveis, do processamento do código ao conhecimento de mundo, mas precisa também processar todos esses níveis de modo instantâneo. A consciência humana, dentro dos limites impostos pela atenção, não tem condições de apreender todos esses elementos no momento em que eles acontecem. Daí a natureza necessariamente inconsciente da compreensão.

Ou seja, compreender é relacionar. Essas relações precisam ser estabelecidas em várias direções, locais e globais, dentro e fora do objeto de leitura, dentro e fora do leitor. Vê-se um texto, uma imagem, uma música, um vídeo e qualquer outro objeto de leitura, como um quebra-cabeça que precisa ser montado em suas partes para se chegar à compreensão em sua totalidade.

Interpretar, por outro lado, é explicar ou desvelar para o leitor de que modo cada quebra-cabeça pode ser montado. Há várias maneiras de se produzir esse desvelamento, dentre os quais destacamos três: a interpretação como paráfrase, como réplica e como procedimento dialético.

Paráfrase é o procedimento mais direto e objetivo: o trabalho do intérprete é produzir outra versão do mesmo objeto de leitura, com a finalidade de explicar ao leitor/aprendiz de que modo esse objeto deve ser compreendido. O perigo maior da interpretação como paráfrase é a possibilidade de mutilar e desfigurar o objeto de leitura. Já a interpretação como réplica tem a seu favor a possibilidade de interlocução entre autores e leitores por meio de comunidades de interesse. Finalmente, a interpretação como procedimento dialético é a que parece oferecer maior possibilidade de retorno no desenvolvimento da compreensão do objeto de leitura, na medida em que permite uma penetração nesse objeto, que é desmontado e recomposto em cada um de seus elementos, mostrando de que modo ele se constrói.

Outra maneira interessante, pode ser exemplificada no “Game de leitura – Falei com Da Vinci”, onde a compreensão e a interpretação são trabalhadas como um procedimento pedagógico de indução ao conhecimento, feito por meio de perguntas, tanto abertas como fechadas, a que estamos dando aqui o nome de interpretação como procedimento dialético. Enquanto que na interpretação como réplica, a interlocução se dá com o autor, na interpretação como procedimento dialético, à semelhança da maiêutica socrática, as perguntas e enigmas do ‘Game’ são dirigidas ao aluno-leitor, que tentará buscar as respostas dentro de si, tentando resolver paulatinamente as contradições que possam surgir no sequenciamento de compreensão, porque na literatura, o como se diz, é tão ou mais importante, do que aquilo que se diz.

Compreensão de textos: é a decodificação da mensagem, ou seja, análise do que está no explícito no texto.

Interpretação de textos: é a interpretação que fazemos do conteúdo, ou seja, quais conclusões chegamos por meio da conexão de ideias e, por isso, vai além do texto.

Texto Baseado em: Um estudo preliminar sobre a interpretação de texto
Vilson J. Leffa - Universidade Católica de Pelotas




Lendo a Nona Sinfonia!

 


No começo do quarto movimento a orquestra se dispersa-se numa chiadeira imponente... Os violoncelos – instrumentos muito próximos ao timbre da voz humana - manifestam seu descontentamento. Diante de tal protesto, a orquestra faz ouvir os primeiros compassos do primeiro movimento. Os violoncelos, uma vez mais, manifestam seu desacordo. O mesmo acontece quando a orquestra. quando a orquestra evoca o começo do segundo e terceiro movimentos. Então a orquestra sugere o tema da alegria. Aí, sim, os violoncelos mostram sua aprovação. E são eles mesmo quem, em uníssono e pianíssimo, tocam o tema completo. O resto da orquestra mantêm-se em escuta. Ao terminar o tema, várias famílias de instrumentos entram em cena com os violoncelos –que repetem o tema – e tecem um contraponto belíssimo, que nos faz pensar na beleza da vinculação interpessoal. Quando conclui o tema agregam-se novos instrumentos para indicar que se incrementa a unidade entre os homens e, ao final, a orquestra completa interpreta o tema de forma homofônica e grandiosa. Seguem-se uns momentos de euforia na orquestra. Quem ouve, tem a impressão de que a alegria que produz esta primeira experiência de unidade faz-se transbordante e a orquestra parece explodir de alegria. Mas a humanidade costuma retomar suas trilhas, e a orquestra manifesta isto repetindo a chiadeira do começo. Diante desta recaída na divergência, Beethoven quer deixar bem claro a mensagem que havia deixado pressentir e apresenta-se pela primeira vez na sinfonia a voz humana. Um barítono exclama com voz potente: “Oh freunde, nicht diese Töne, sondern lasst uns angenehmere, und freundvollere” (Oh amigos, estes tons não: deixem-nos ouvir outros mais agradáveis e alegres. Estes dois versos foram escritos pelo próprio Beethoven como prelúdio à Ode à Alegria de Schiller, que é cantada a seguir e culmina numa passagem sublime que termina com estas palavras (Irmãos, por cima das nuvens tem que habitar um pai amoroso).

A segunda tarefa cumpriu-se com a realização da Missa Solene. Já em plena maturidade, quando viu-se reduzido a um estado de ruína humana – completamente surdo, o que é uma tragédia para um musico de grande talento: quase cego, fracassado economicamente e muito debilitado em sua saúde – Beethoven, mesmo tendo um caráter muito forte, não se rebelou contra a Providência: retirou-se em uma aldeia na fronteira austro-húngara para compor “um hino de louvor e agradecimento ao Supremo Criador”, conforme suas palavras. O fruto deste retiro foi uma das maiores obras da arte universal, a Grande Missa em Ré maior.

Beethoven nunca viveu a arte como diversão, ou como meio para ganhar prestígio ou bens materiais. Sua atividade artística foi em todos momentos o vínculo vivo da sua pessoa para com os outros seres humanos e com o Ser Supremo, “Ah, parecia-me impossível deixar o mundo antes de produzir tudo aquilo para o que me sentia dotado – escreve no testamento.



Ladrões de Livros




As primeiras bibliotecas romanas foram formadas por saques de toda a Grécia.

Na Idade Média, o livro era um objeto raro e luxuoso, que praticamente só era encontrado nos mosteiros. É evidente que analfabetos não roubariam os livros, se assim fosse não saberiam exatamente seus valores, mas como sabemos naquela época ter um livro era privilégio de poucos. De 1455 a 1500 foram produzidos os mais belos incunábulos. Ladrões de livros nesta época eram verdadeiras pragas. E a arma mais usada para combatê-los eram as maldições. O mosteiro de St. Máximim ameaçava os ladrões com pragas parecidas com as de Judas e Pilatos. As penas mais graves eram a excomunhão e a possibilidade de ter o nome riscado do Livro da Vida.

Na Renascença, com a larga impressão de livros, estes não eram mais objetos tão cobiçados. No entanto, a sede do conhecimento fez com que as bibliotecas tivessem muito trabalho no policiamento.

Parece-nos que a religião cristã sempre foi veemente contra tais atos, sendo que o papa Benedito XIV lançou uma bula em 1752, excomungando quem roubava livros, tamanha era a praga. Os clérigos eram os maiores ladrões de livros, entre os mais famosos estavam o Cardeal Pamfilio, que se tornou o papa Inocente X e o Pastor Tinius. Abaixo dos clérigos, os estudantes. Mas, acima de todos, a profissão que mais formou ladrões de livros foi sem dúvida a dos bibliotecários.

No entanto, o maior ladrão de livros de todos os tempos foi Guglielmo Bruto (1803-1869), o famoso conde Libri, que por sete anos roubou e vendeu obras raras. Com a Revolução de 1848, foi descoberto e fugiu para a Inglaterra com dezoito caixas de livros roubados, avaliados em 25 mil libras, uma pequena fortuna para época. Em 1850, foi condenado a dez anos de prisão e morreu preso e pobre na Itália, em 1869.

Autor: Fernando Mustafá
Original AQUI


O Que um Livro Deseja




O que um Livro deseja do Leitor:
- Que compreenda o que lê; 
- Que leia também o que não está escrito, leia o que está implícito nas entrelinhas,
- Que estabeleça relações entre o texto que lê e outros textos já lidos.
- Que extrai-a informação do texto e confira essa informação com base em seus conhecimentos e suas experiências, 
- Que apropria-se da informação e atribui a ela um significado,
- Reflita de que maneira a leitura informou, acrescentou, provocou, inseriu ideias na sua mente. 
Um livro deseja que o leitor entenda, que o ato de ler não é uma atividade passiva, é ele, o leitor que vai 'funcionar' o texto. Mobilizando estratégias, fazendo inferências, estabelecendo relações, utilizando seus conhecimentos prévios e pesquisando para dar coerência aos vazios implícitos, subentendidos ou ocultos nos interstícios. Acima de tudo, um livro deseja que o leitor tenha consciência que o ato de leitura não é conseqüência do saber ler. 
"LER, É SBAER JUTNAR LRETAS. LEITURA, É SABER PORQUE ESSAS LETRAS SE JUNTAM." (eucajus)
Leitura exige a ativação de distintas competências e estratégias num processo ascendente em que podemos (des)construir conceitos para nossa formação pessoal e social.

Relações



Ler é estabelecer relações entre o que se conhece e o que se apresenta como novo. Basicamente é uma capacidade adquirida e aperfeiçoada pela experiência. Mesmo quando se fala metaforicamente. 

Na comunicação imediata, entre interlocutores, há outros fatores que podem ser levados em conta, como gestos, expressões faciais, tom de voz. Em um texto diminuem consideravelmente esses fatores que influenciam na apreensão da significação de um ato de comunicação e, portanto, são necessários cuidados adicionais para que a mensagem preserve o significado original atribuído por seu produtor. Acreditamos ser esse um dos fatores mais intrigantes da leitura: a ausência do destinatário no momento da produção do texto e a ausência do destinador no momento da recepção do texto.

Outras questões pertinentes sobre leitura são: de onde vem, o sentido daquilo que se lê? Quem é responsável pela construção do sentido na obra: o autor, o leitor ou o texto Um pouco em cada um, e nunca completamente em nenhum. O leitor, guiado pela obra e pelo autor, adiciona ou subtrai da obra significados de acordo com sua própria experiência. O autor, como construtor do texto, é responsável por parte do seu significado, mas não consegue controlar toda significação produzida.

Eco (1993) nos fala de livros seus, cujos leitores encontraram referências sobre as quais ele não tinha pensado, mas que ele não podia negar que estavam ali construídas como significados em sua obra.

Eco menciona também que, como autor, “escondeu” no texto certos significados que só poderiam ser descobertos por um leitor mais arguto, justificando que o texto também poderia ter sido compreendido por alguém que não conhecesse aquelas referências, mas que se tornaria mais saboroso àqueles que as reconhecessem.



Antigo não é Raro!



Um livro não é valioso porque é antigo, toda biblioteca pública está cheia de livros antigos, que, se fossem postos à venda, não valeriam mais que o seu peso como papel velho. O valor de um livro nada tem que ver com a sua idade.

Quando se trata de raridade, deve-se tomar cuidado porque ela é relativa e depende de alguns fatores. A primeira grande impressão é pensar que livros velhos são raros. Livro velho nem sempre é raro, existem livros velhos que nada valem, mas livros antigos publicados no berço da invenção da tipografia de Gutenberg ou anteriores a 1504, os incunábulos, como são conhecidos, que são raros, pois sobreviveram ao castigo do tempo e foram preservados por gerações de bibliófilos e bibliotecários.

Unicidade pode tornar um livro em raridade. Entretanto, o fato de um livro ser único também não indica que é raro, pois é impossível pré-determinar as características de um livro raro, porque cada livro é um universo restrito de manifestações culturais – originais e acrescentados.

O estado de um livro e sua conservação também é importante. Mas, a conservação de livros não se aplica somente ao papel, mas também ao tipo de matéria usada na encadernação e, se for original, o livro pode valer mais ainda.

As primeiras edições também são características muito almejadas pelos amantes dos livros. O livreiro A.S.W. Rosenbach (1873-1946), um dos maiores caçadores de obras raras americanas e um dos primeiros a usar a coleção de livros como fonte de investimento financeiro, certa vez disse: “uma primeira edição para um autor é tão seu trabalho original quanto uma pintura é para um pintor”. A esse fator podemos lincar a popularidade do autor e a aceitação do público pela obra.

Livros também costumam a ser valorizados quando possuem assinaturas, dedicatórias ou comentários do autor sobre a primeira edição impressa, ou comentários de outros escritores.

Ex-libris são selos ou figuras ricamente ilustradas e com citações geralmente em latim feitas para identificar o dono do livro. É como um carimbo que marca a posse da obra – em geral rara. Os ex-libris ajudam a identificar o valor do livro e também são objetos em si de colecionismo.

Erratas também podem tornar livros raros, como no caso da bíblia inglesa de 1631, que vale muito dinheiro, simplesmente por que o tipógrafo esqueceu o ‘não’ ao Imprimir o Sétimo Mandamento ‘Não cometerás adultério’. A brincadeira custou trezentas libras ao gaiato e toda a edição foi queimada, com receio de que os leitores não percebessem o engano e seguissem o mandamento tal qual tinha sido impresso. Mas sobraram quatro exemplares.

Mesmo em tempos de massificação e de universalização, não se poderá impedir os colecionadores de construir a raridade. Porque apesar da raridade ser objetiva, ela é, de fato, com freqüência construída. Um livro é raro a partir do momento em que há bibliófilos para procurá-lo. Se não há ninguém interessado, mesmo que tenha sido publicado em um único exemplar, ele não é raro.

Estamos falando da bibliofilia, que começa no fim do século XVII ou no começo do século XVIII, nos meios financeiros, e supõe que seja definido o universo do colecionável. 

------------
Os incunábulos – do latim “in cuna” (no berço) foram os primeiros livros impressos na invenção da imprensa tipográfica dentre o período de 1455 a 1500 quando surgiu um novo método de impressão.

Os incunábulos são os precursores do livro como hoje conhecemos; representam a evolução da arte da impressão até atingir a sua maturidade, a transição das tradições artísticas e eruditas para métodos mais modernos e profissionais. Os primeiros incunábulos se assemelhavam aos manuscritos: não havia nenhuma informação na primeira folha, os tipos imitavam a caligrafia da época, inclusiva nas ligaduras e abreviações.

--------------
Autor: Fernando Mustafá Costa
Fonte: Monografia de Conclusão do Curso de Biblioteconomia
Orientador: Prof. Dr. Waldomiro Vergueiro - São Paulo, 05/13/2009


Harry Potter e Dan Brown




Alguns intelectuais afirmam que é uma estupidez achar que Harry Potter forma futuros leitores. Para eles, leitores de Harry Potter serão no máximo, futuros leitores de Dan Brown, não de “ficção séria”. O argumento prossegue afirmando: quem assiste à telenovela não necessariamente assistirá a filmes de Godard e Bergman. Apesar de ser verdade que muitos jovens que se apaixonaram pela saga do bruxinho nunca mais lerão nada na vida, também é certo de que leitura não é uma atividade fácil!

Sou incentivador ferrenho da leitura, sou viciado em leitura, sou poeta. Mas, não suporto o apelo poético de que a leitura é um prazer! Obviamente que absolvo desse pensamento os adeptos do sadomasoquismo! Em um universo com dezenas de estímulos audiovisuais por todos os lados, retirar-se para um canto para ler será considerado cada vez mais um hábito excêntrico. A leitura, além de não permitir a passividade da televisão, exige o cultivo da solidão e do silêncio. Ler não é uma atividade natural. Dói os braço! Os óio! O lombo! Até o bumbum dói!

Essa é uma verdade sobre a atividade de leitura. Porque não dizer a verdade a esses jovens? Seria intencional tal omissão? Porque dizer a verdade sobre a atividade de leitura diz respeito ao seu poder de conscientização e a sua essência, o esclarecimento!

Se é Harry Potter e Dan Brown é o que estão lendo. Certo, vamos falar sobre eles: Que mundo é esse J.R. criou? Como criou? O que ela quer dizer com isso, com aquilo? Existe magia? O que é magia? Alguém da turma sabe fazer uma mágica? Vamos aprender fazer mágica? Melhor, vou fazer uma mágica com palavras... Em que livro está essa frase...? O coral afinado da turma dirá - Código da Vinci!!! Não meus queridos essa frase está em Santo Graal e a Linhagem Sagrada, mas muito antes esteve na boca de Percival no Conto do Graal... isso meus queridos alunos! É mágica... Talvez não fosse a intenção de Dan Brown, mais ele nos ensina que o passado sempre volta! Como ratinhos num laboratório, respondemos ao bombardeio de estímulos para roda jamais deixar de girar.  Na aula de hoje falamos muito da fantasia de Código da Vinci e da Magia de Harry Potter, mas a grade verdade é que falamos sobre nós mesmos! Sobre nossos desejos...

Bom... essa atitude irremediavelmente abarcará uma intensa oralidade em sala! Sei que hoje a opção, é silenciá-la.